sexta-feira, 22 de maio de 2009

Você lembra dela?

Por Beatriz Cotrim e Regina Buffolo

Kim Phúc ficou conhecida aos nove anos de idade, em 1972, após ter seu corpo e suas roupas queimados com Napalm, durante a Guerra do Vietnã. O fotojornalista Nick Ut divulgou a foto de seu momento de dor e logo esta circulava todo o mundo mostrando as atrocidades do conflito.

De tanto ser mostrada, essa fotografia, junto com outras duas, fizeram com que a opinião pública mundial, e principalmente, a americana se posicionasse a favor da retirada das tropas americanas do país asiático.

Para alguns críticos, a repetição dessas imagens é considerada uma forma de espetáculo midiático. Porém, o papel do jornalismo é divulgar os fatos para a sociedade, e um acontecimento como esse é de vital importância para o mundo, justificando assim, a veiculação dessa imagem, que ajudou a por fim a um conflito que nem mesmo possuía um argumento válido para estar acontecendo.

Kim Phúc foi levada ao hospital por Nick Ut e lá permaneceu por 14 meses. Passou por 17
cirurgias. “Meus pais guardaram a foto, que tinha saído num jornal, e depois a mostraram para mim.’Esta é você, quando você estava ferida’, disseram eles. Eu não consegui acreditar que era eu, era uma foto aterrorizante.
Eu acho que todas as pessoas deveriam ver essa foto, mesmo hoje.
Porque essa foto mostra claramente como uma guerra é terrível para as crianças. Você pode ver o terror no meu rosto. Basta ver a foto, para as pessoas aprenderem”.

Kim Phúc sobreviveu e hoje ela é Embaixatriz da Boa Vontade da Unesco.

13 comentários:

  1. Até concordo com vocês sobre como é importante frisar fatos de relevância para sociedade, como a Guerra do Vietnã, mas é preciso que tudo tenha uma medida. Vejo gente no orkut colocando fotos de guerra ou crianças africanas flageladas pela fome só para dizer que se importam com o mundo, e o que eu sinto é que isso tira a força dessas imagens, banalizando os problemas dessas pessoas. É necessário que a história contada na foto sirva de alerta e não de artimanha para pseudo-militantes de causas sociais.

    ResponderEliminar
  2. Tambem concordo, é desnecessário colocar fotos no Orkut sobre pessoas 'morrendo' de fome, mto magrinhas, para causar aquela impressão "vou mudar o mundo". Por outro lado, a história deve servir de exemplo para a sociedade, sem exageros é claro, mas é importante analisar como o mundo melhorou, apesar que muitas crianças morrem por conflitos ou subnutridas, até mesmo no Brasil!

    ResponderEliminar
  3. Concordo.

    E,a informação sobre a foto em si está incorreta. Em 1972 já não haviam, tropas de combate americanas em larga escala, se é que havia alguma coisa que não unidades pequenas para defesa de determinadas guarnições. Se não me engano (e gostaria que verificasse isso) os pilotos dos Skyraider que bombardearam a vila na qual a jovem se encontrava, eram todos da Força Aérea da República do Vietnã (Força Aérea Sul-Vietnamita) que tinham sido informados que a vila estava sendo ocupada apenas por tropas Norte-Vietnamitas e portanto poderiam bombardear a vila sem medo de baixas entre civis.

    Na verdade, me parece que os Norte-Vietnamitas realmente estavam lá, mas usaram os civis na vila como escudo, na esperança de não serem atacados. Realmente os pilotos não tinham como saber que haviam civis na linha de fogo, o que é uma pena.

    Mas vale lembrar, que apesar dos esforços diplomáticos que estavam acontecendo secretamente desde dezembro de 1971 com o objetivo de acabar com a guerra entre os dois países, no dia 3 de março de 1972 tropas regulares norte-vietnamitas apoiados por divisões de infantaria mecanizada com apoio de blindados (tanques), invadiram o Vietnã do Sul de maneira convencional, ou seja não se tratava mais de uma guerra de guerrilha.

    Nixon, contrariado por ter sido 'enrolado' pelos norte-vietnamitas, mas sem apoio político para enviar tropas para o Vietnã do Sul, que por si só já não continha tropas americanas, apenas mal treinadas tropas sul-vietnamitas, ordenou o aumento do número de aeronaves no teatro de operações e iniciou a operação "Freedom Train" no início de abril para conter a invasão comunista, e obteve sucesso.

    ResponderEliminar
  4. Portanto a invasão foi contida por 'via área' e cenas como o bombardeamento da vila desta menina, infelizmente foram comuns, mas necessário do ponto de vista militar. Embora a mídia tenha sim repercutido na opinião pública americana e, ulteriormente, na decisão da retirada, o 'estrago' já havia sido feito em 1968 quando as imagens da Ofensiva do Tet foram televisionadas.

    Nixon, por exemplo, fora eleito com a promessa de que tiraria os EUA do Vietnã e ele realmente cumpriu a promessa, retirando as tropas. Politicamente Nixon poderia enviar os pilotos de volta para a Guerra, mas nunca as tropas.

    A imagem simbolizou, na minha opinião, todo o sofrimento do povo vietnamita durante esse conflito, e para os americanos como um todo a confirmação do sentimento quase que absoluto de que deveriam mesmo se afastarem da região, mas ela em si chegou muito tarde para causar qualquer impacto que não psicológico, pois de fato os americanos já não estavam mais lá.

    ResponderEliminar
  5. "os pilotos dos Skyraider que bombardearam a vila na qual a jovem se encontrava, eram todos da Força Aérea da República do Vietnã"
    Na verdade foi um piloto americano mesmo, que inclusive a uns anos atras encontrou com ela e pediu perdão

    ResponderEliminar
  6. Acho que a citação na verdade deveria ser:

    "Se não me engano (e gostaria que verificasse isso) os pilotos dos Skyraider que bombardearam a vila na qual a jovem se encontrava, eram todos da Força Aérea da República do Vietnã (Força Aérea Sul-Vietnamita)"

    Pelo menos alguém verificou e agradeço bastante. Mesmo assim, as aeronaves pertenciam à Força Aérea da República do Vietnã. Não acho que a USAF operava Skyraiders à essa altura. A esmagadora maioria fora repassada aos sul-vietnamitas, mas não impede que pilotos da USAF os estivessem voando, ou pelo menos liderando as missões devido à falta de pilotos qualificados.

    Achei legal o encontro e o pedido de desculpas. Provavelmente o piloto deveria estar muito emocionado. Pilotos geralmente não gostam de saber do efeito que suas bombas possam fazer em civis para que possam continuar sãos.

    ResponderEliminar
  7. Primeiro, obrigada por ajudar na nossa discussão!=)
    Antes de 1972 o mundo já se questionava sobre o verdadeiro sentido dessa guerra, que não possuia uma justificativa clara, e essa foto acelerou o processo que estava já gestado, pois a quantidade de mortes americanas em solo vietnamita já tinha feito a população americana se cansar. A foto de Kim Phúc foi a gota d'água ...
    Bom, sobre o skyraider, o Leonardo já respondeu, e pelo o que eu pesquisei, ele está certo. Achei um depoimento sobre o capitão que ordenou o ataque:

    (Narração de John Plummer)
    "Eu estava na sala lendo um livro com a televisão ligada baixinho. Era uma noite cálida e agradável de verão em 1996, e eu estava contente por ter uns momentos de sossego sozinho.

    Subitamente apareceu na tela uma foto, uma imagem que há anos me perseguia. Por mais que eu a visse, a dor sempre voltava. Como eu poderia ser perdoado? Como poderia sequer falar da minha participação nisso? Uma menininha vietnamita correndo na direção da filmadora com os braços estendidos, gritando histericamente de dor por causa das terríveis queimaduras de bomba napalm.

    Esta foto vencedora do prêmio Pulitzer comovera milhões de pessoas, mas doía ainda mais a mim particularmente, pois eu era o responsável pela agonia que ela sentira.

    Inclinei-me para a frente e aumentei o volume. O repórter revelava que a menina, Phan Thi Kim Phuc, casara-se e estava morando em Toronto.

    Ela está viva, pensei agradecido.

    Meus pensamentos retrocederam ao ano de 1972, quando eu era um capitão do exército americano no Vietnã. Estava encarregado da equipe aérea G3 do Terceiro Batalhão Regional de Auxílio (TRAC), e planejava os alvos B-52, fazia a rota e coordenava o apoio prestado aos bombardeiros pelas equipes em terra. Se um batalhão tivesse problemas eu é quem tinha que suprir apoio no ar, e rápido.
    Aquela primavera, da minha posição na cabine de comando eu falava ao rádio com um consultor americano para um batalhão no sul do Vietnã que queria invadir a cidadezinha de Trang Bang.

    ResponderEliminar
  8. "Precisamos de ajuda", ele disse gravemente. Os vietcongues estavam escondidos em trincheiras perto deles. Deu-me as coordenadas para o alvo.

    Após estudar o mapa fiquei perplexo. "Fica bem na periferia do vilarejo", eu disse. "E os civis?"

    "Lá não têm civis", ele respondeu. "Saíram todos. Foram retirados."

    Eu sabia que a melhor munição para o inimigo entricheirado era napalm e bombas altamente explosivas. Já que o alvo estava perto de nossas tropas, eu queria atacar da forma mais exata possível. Localizei uma unidade aérea vietnamita no sul com aviões A-37 e A-1E.

    Mas ainda me preocupava. Para ter plena certeza busquei confirmação do quartel-general perguntando qual a situação dos civis na região. Fui informado de que todos tinham se retirado.

    Dei o OK e mais ou menos cinco minutos depois o consultor avisava: "Na mosca. Nossas tropas de terra estão entrando".
    Uma missão rotineira, pensei. Eu já fizera isso dezenas de vezes.

    Três dias depois fui para o refeitório e retirei da pilha à porta um exemplar do The Stars and Stripes, o jornal militar. Peguei minha comida, meu café, sentei-me e abri o jornal. Dei de cara com uma foto estarrecedora. Uma menina de nove anos correndo do fogo. O artigo dizia que ela ficou queimada devido a um ataque aéreo contra o vilarejo de Trang Bang.

    O ataque que eu ordenara.

    Minha mão tremia e o café quente espirrou na mesa. Por um momento eu nem consegui respirar. Um rapaz à mesa ficou me encarando sem entender, e eu murmurei: "Foi o ataque aéreo que eu aprovei".

    Foi a primeira e única vez que mencionei esse incidente quando estava no Vietnã. Ninguém me questionou e tentei esquecer. Mas o sentimento de culpa - a terrível angústia aumentava. Não fui procurar um capelão porque há muito já desistira de igreja. Quando voltei aos EUA parecia que essa foto estava em todos os cantos - revistas, jornais, na televisão. Eu não conseguia afastar isso de mim.

    Depois que fui dispensado em 1974, a minha vida era de uma infelicidade desesperadora.

    Na tentativa de apagar minhas lembranças dolorosas eu bebia demais. Dois casamentos acabaram em divórcio. Deficiente emocionalmente, eu não conseguia me abrir com ninguém.

    Aí num encontro marcado na véspera de Ano Novo com alguém que eu nem sabia quem era, conheci Joanne. Ela era uma cristã convicta e juntos começamos a freqüentar a igreja da minha infância no município de Hoke, na Carolina do Norte. Casamo-nos lá. Eu adorava Joanne, mas sua franqueza e generosidade com outros me deixavam sem jeito.

    Ela estava sempre fazendo algo por alguém, muitas vezes com prejuízo para si própria. Eu não entendia onde ela obtinha a energia e o amor que tinha.

    No final da década de 80 tornei-me um executivo de uma grande companhia contratada pelo ministério da defesa para fazer armamentos e fomos transferidos para o norte do estado da Virginia, onde encontramos uma igreja em Vienna. Lá vi as pessoas realmente fazendo o que pregavam. Num retiro um fim de semana comecei a chorar ao perceber como estava longe de ser o que Deus queria que eu fosse. Em novembro de 1990 entreguei minha vida a Cristo, e pela primeira vez entendi o verdadeiro significado da graça divina. Fui perdoado, e ainda sentia muito remorso e dor pelo sofrimento daquela menininha.

    À medida que fui crescendo na fé senti o Senhor me chamando para pregar. Com o apoio de Joanne fiz seminário e vim para Purcellville como pastor da Igreja Metodista Unida Betânia.

    Foi ali na minha sala que vi novamente a foto que me perseguia. Pela primeira vez ouvi falar sobre a menina. Depois de recuperar-se das queimaduras, Kim Phuc foi utilizada pelos comunistas como meio de propaganda, apesar dela não querer. Foi enviada a Cuba para estudar farmácia, e lá apaixonou-se por um outro estudante vietnamita. O casal ganhou uma viagem a Moscou de presente de casamento e foram passar a lua de mel lá. Na volta, quando o avião estava reabastecendo na Terra Nova, eles pediram asilo político. Moravam agora em Toronto com seu filhinho.

    A emoção tomou conta de mim.

    ResponderEliminar
  9. Eu queria muito procurá-la, mas tinha medo. Não conseguia imaginar que ela fosse querer ver o homem que tinha lhe causado tanto sofrimento.
    Várias semanas depois, numa reunião da Associação de Pilotos de Helicóptero no Vietnã que ocorreu na Califórnia, conheci Linh Duy Vo, um poeta vietnamita. Linh conhecia Kim Phuc e Nick Ut, o fotógrafo que tirou a famosa foto.

    Fiquei sabendo que em Trang Bang, na época, Kim Phuc e sua família estavam dentro de um templo quando o vilarejo foi bombardeado. Fugiram para a rua, onde ela foi queimada pelo napalm. Nick Ut correu com ela para o hospital, onde não deram esperança dela sobreviver. Ficou hospitalizada por um ano e dois meses. O queixo fundira-se ao peito, e o braço esquerdo estava grudado na costela. Um cirurgião plástico americano a operou e ajudou-a a recomeçar a vida.

    Depois que voltei para Virginia, Linh entrou em contato comigo e disse que contara a Kim Phuc sobre mim. Ele disse que ela era cristã e achava que devíamos nos ver. Mas eu quis fugir da possibilidade, pois era doloroso e amedrontante demais.

    Depois fiquei sabendo que ela compareceria às cerimônias no Dia dos Veteranos no Vietnam Veterans Memorial em Washington, capital do país. Eu já planejara estar na Parede. Era como se o Senhor estivesse arquitetando o nosso encontro.

    Na segunda-feira do dia 11 de novembro de 1996, eu estava presente no local do memorial de granito preto encerado. Havia vários outros veteranos comigo, dando-me apoio emocional. Esperamos a manhã inteira e nem sinal de Kim Phuc.

    Subitamente ouviu-se uma comoção no meio do público e vi repórteres e fotógrafos rodeando uma vietnamita baixinha que estava sendo levada ao palco dos preletores.
    Um senhor apresentou Kim, explicando que dois membros de sua família haviam morrido naquele dia em Trang Bang. Oh Deus, tenha misericórdia, pedi. Comecei a tremer e a soluçar descontroladamente.

    Meus colegas colocaram os braços no meu ombro. Kim então falou: "Se eu pudesse conversar cara a cara com o piloto que jogou as bombas eu lhe diria que não podemos mudar a História, mas que deveríamos tentar fazer coisas boas no presente e no futuro de modo a promovermos a paz".

    Com as mãos trêmulas escrevi um bilhete: "Preciso falar com você por um momento", e entreguei a um guarda do parque para passar para ela. Só que a essa altura a cerimônia terminara e Kim saiu acompanhada. Fiquei muito triste, pois nunca mais a veria.

    Um amigo então correu dizendo: "Vou levá-lo até ela". Abrindo caminho por entre a multidão ele me levou até Kim Phuc, que estava para entrar numa viatura policial. Alguém lhe disse que eu estava lá. Ela virou-se e olhou-me nos olhos. Com o rosto cheio de compaixão ela abriu os braços e enterrei-me em seu peito soluçando. "Sinto muito. Sinto muito mesmo. Eu não queria ter machucado você".

    — Eu te perdôo. Eu te perdôo. - ela disse abraçando-me. Em um instante o remorso desapareceu e o fardo foi retirado das minhas costas.

    Fui convidado a acompanhá-la até o hotel onde estava hospedada. Lá conversamos por muito tempo, e eu não parava de pensar que era incrível estar diante de Kim Phuc. Por 24 anos eu fugira da dor que lhe causara, e agora Deus finalmente nos colocara juntos. Por fim senti paz em relação ao meu passado.

    No final da visita demo-nos as mãos e oramos, sentados num sofá no saguão do hotel. Agora continuo impressionado com o poder do amor de Deus. Quando eu nem conseguia me perdoar, Deus ajudou-me a receber o perdão da pessoa cujo perdão eu mais precisava. ''

    ResponderEliminar
  10. Então, realmente o piloto e aeronave eram Sul-Vietnamitas e esse americano era o "FAC" do USAr, interessante.

    MUITO obrigado pelo artigo. Não é o primeiro caso de algum americano que matou teve problemas em aceitar o que teve que fazer no Vietnã. Muitos tornaram-se devotos após a guerra quando antes não ligavam para religião.

    Achei a história fascinante, e fico feliz com o desfecho. Existem histórias muito interessantes sobre o comportamento humano ante a situações especiais. O Vietnã tem inúmeras delas. Quando eu chegar eu posto algumas aqui.

    ResponderEliminar
  11. As imagens servem para ativar a memória das pessoas, principalmente hoje em dia, E elas só são usas de outra maneira por pessoas que não tem bom senso, ou nenhum tipo de sentimento humana, mas creio que essa ˜não é a discussão...já que enquanto existirem pessoas ativistas no mundo...ele talvez um dia se torne melhor...pelo simples fato de alguém estar caminhando

    ResponderEliminar
  12. Divulgar imagens como essa é uma das obrigações do jornalismo, afinal retrata o que está acontecendo. No entanto a descontextualização banaliza a imagem.

    Não adianta nada colocar uma imagem chocante, se o receptor não conseguir entender o que está ali retratado.

    Eu mesma nunca tinha reparado profundamente nessa foto, nunca tinha dado importância para o pânico no rosto da menina. O motivo é que desde criança vejo essa imagem, e nem ao menos sabia a situação em que ela havia sido tirada, por que vira algo banal, natural, que não leva a um questionamento.

    Talvez esse seja o maior desafio: Saber o limite entre expor uma foto o tempo suficiente para ela provocar reflexão e saturar essa imagem a tal ponto que ela perde seu significado.

    No meu imaginário essa imagem era "gravura" de livros de história.

    Parabéns pelo texto...adorei!

    ResponderEliminar